O que é ser "Anti-Usuário"?
Anti-usuário (em Inglês: anti-user) são técnicas, práticas, e decisões de design em um sistema tal como aplicativo, website, ou interface gráfica que são contrários aos desejos de seus usuários, estabelecidos para atingir objetivos de negócio do desenvolvedor do sistema.
Práticas anti-usuário ocorrem quando um desenvolvedor deseja extrair lucros de seus usuários maiores que os usuários estão dispostos a providenciar livremente. Por exemplo, a maioria dos websites pode ser acessada gratuitamente, e seus usuários não pagariam por acesso, logo, para extrair lucro dos usuários, é necessário forçá-los a serem lucrativos de alguma forma. Um método seria o uso de propagandas de Internet. Usuário nenhum quer ver propagandas, e, se pudesse escolher, se fosse permitido essa liberdade de usuário, escolheria não ver e obter o conteúdo do website gratuitamente. A prática de forçar o usuário a ver propagandas seria então anti-usuário.
Observe que, em alguns casos, não é possível para um website existir sem forçar o usuário a ser lucrativo. O usuário pode reclamar das práticas anti-usuários, mas sem elas poderia não haver website para começo de conversa, o que poderia ser um maior problema para o usuário, ou pelo menos para alguns usuários que usufruem do serviço gratuito. Podemos dizer que praticas anti-usuário podem ser um mal necessário, e até mesmo beneficial ao usuário, pois usuários em geral não têm ciência do custo de serviços gratuitos, ou simpatia por usuários que dependem de plataformas gratuitas. Em outras palavras, eles não têm a competência para decidir o preço pago pelo serviço quando decidem que o preço deve ser zero. Há muitos casos onde é necessário forçar indivíduos a fazer algo que não querem, mas que os beneficiaria em longo termo, pois não estão pensando em longo termo ou em consequências ao ambiente que habitam.
Por exemplo, muitos websites possuem popups irritantes pedindo que inscreva seu e-mail para enviar notificações. Entretanto, sem essas inscrições, o website depende de motores de busca como o Google para receber visitantes, o que significa que precisaram criar páginas otimizadas para aparecer nos primeiros resultados do Google (prática chamada de SEO). Em muitos casos, os mesmos usuários que reclamariam dos popups também reclamariam do SEO que torna as páginas em "feitas para motores de busca" em vez de "feitas para usuários humanos." Esses usuários não saberiam responder como que o website ganhará visitantes sem uma dessas coisas, pois o usuário não faz parte da indústria. Se pressionarmos esse usuário, a conclusão será que o usuário não se importa com a sobrevivência do website por que ele é um website ruim, cheios de popups, com SEO, anti-usuário. Para ele, o website não deveria existir, logo não se considera como ele existiria de outra maneira, ignorando o fato que o website só existe graças as práticas anti-usuário que implementa.
Se uma empresa possui monopólio sobre um setor do mercado, ela pode exercer quaisquer práticas anti-usuário sem temer que seus usuários irão mudar para outra empresa, já que não há alternativa. No mundo da tecnologia, devido a muitas tecnologias dependerem de outras tecnologias que servem de suas plataformas, o monopólio da plataforma pode existir em prática devido a tecnologias que dependem daquela plataforma terem monopólio. Por exemplo, o Windows não é o único sistema operacional, há sistemas Linux, mas se um aplicativo só funciona no Windows, é como se as alternativas não existissem. Graças a isso, a Microsoft pode exercer diversas práticas anti-usuário em seu sistema, sem se preocupar que seus usuários que dependem de aplicativos que só rodam no Windows irão migrar para seus adversários.
Outra prática anti-usuário, a qual a Microsoft exerce, é a telemetria forçada. Telemetria seria o envio de informações sobre seu uso de um software em seu computador para o desenvolvedor via Internet. Essas informações possuem mérito: o desenvolvedor pode usá-las para melhorar o software e decidir para quais áreas alocar seus recursos de desenvolvimento. Os motivos de sua existência são que o usuário não costuma providenciar essas informações por conta própria embora que usufrua de melhorias no software, e, em muitos casos, o usuário não possui a capacidade técnica para providenciar o tipo de informação que o desenvolvedor precisaria para análise. Com isso, um software de telemetria seria criado para enviar essas informações automaticamente no formato que o desenvolvedor deseja. Em casos éticos, como encontrados no Linux, o consentimento do usuário é necessário para habilitar telemetria, e é possível inspecionar quais informações estão sendo enviadas para ter certeza que elas são suficientemente anônimas e não comprometem a privacidade do usuário. Em casos anti-usuário, não é possível optar para desabilitar o envio de informações telemétricas: o usuário é forçado a providenciar ao desenvolvedor informações para melhorar seu software.
Note que websites em geral fazem uso de telemetria, sempre fizeram, e quase ninguém reclama disso. Eu, pessoalmente, não reclamaria. Porém, na minha opinião, existe uma diferença gigantesca entre um website e um programa rodando no meu computador. O website, por rodar dentro de um navegador de Internet, está "contido" dentro nele (prática chamada de sandbox), não sendo capaz de acessar meus arquivos que estão fora do navegador, nem de coletar informações sobre meu uso em outros websites no mesmo navegador. Toda informação que pode ser coletada pelo website estaria relacionada a meu uso daquele website especificamente. Por outro lado, um programa rodando no computador seria capaz de enviar meus arquivos pessoais para Internet sem meu consentimento. Seria ilegal, mas seria possível e relativamente fácil de ser fazer na prática. Nas mãos erradas, há risco desse tipo de telemetria se tornar em espionagem.
Na Internet, outro tipo de prática frequentemente chamada de anti-usuário são algoritmos de recomendação encontrados em redes sociais que visam aumentar o tempo que o usuário passa na plataforma, extraindo lucro exibindo o maior número de propagandas por usuário. Por si só, não existem muitos problemas éticos com essa prática na minha opinião. Entretanto, em muitos casos os algoritmos recomendam conteúdo que gera controvérsia, que é mensurada (e.g. por número de comentários em um post) para treinar um modelo de inteligência artificial para recomendar mais conteúdo que gera a maior quantidade de controvérsia mensurável possível. Esse tipo de conteúdo geralmente gera emoções negativas: é política, crime, guerra, doença, drama, que causa raiva, stress, indignação, tristeza. Enfim, no final das contas a rede social estaria gastando a saúde mental de seus usuários para obter lucro. Note que essa consequência não se deve do algoritmo de recomendação em si. É possível arquiteturar um sistema que recomende conteúdo não-negativo, alinhado aos interesses do usuário (veja Pinterest para um exemplo). De fato, diversas plataformas são programadas para nunca recomendar (censurar) certos tipos de conteúdo. As que não os fazem simplesmente acham que não é sua responsabilidade filtrar o conteúdo recomendado já que foi postado por usuários da plataforma, em outras palavras: são plataformas irresponsáveis.
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